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SÃO PAULO - O hábito de tuitar o tempo todo colocou o coordenador do projeto Software Livre Brasil e por três anos o principal nome por trás da Campus Party Brasil, Marcelo Branco, no centro de uma polêmica.

Após tuitar pelo celular durante um encontro com o presidente Lula, Branco foi acusado de vazar informações privadas e influenciar a cotação das ações da Telebrás, empresa pública que deve receber pesados investimentos este ano em função do Plano Nacional de Banda Larga.

A forte oscilação dos papéis da Telebrás na Bovespa, causada pela expectativa de pesados aportes na empresa, faz a CVM, órgão regulador da Bovespa, investigar as ondas de investimentos na companhia pública.

Branco, que não possui aplicações em bolsa, participou de um encontro com Lula e técnicos do governo acompanhado de profissionais ligados ao Comitê Gestor da Internet, como Demi Getschko, pesquisadores como o professor Sérgio Amadeu e representantes de movimentos de inclusão digital no início de fevereiro.

De férias em Santa Catarina, após anunciar que não vai organizar a Campus 2011, Branco deu sua versão para a polêmica, defendeu investimentos públicos em banda larga e pediu a reforma de leis de direitos autorais e a regulamentação do marco civil da internet no Brasil.

O Twitter anda lhe dando dores de cabeça?

Não exatamente. Como se sabe, participei de uma reunião pública com várias personalidades da sociedade civil e com representantes do governo, inclusive o presidente Lula. O encontro era para discutir o Plano Nacional de Banda Larga. Antes de começar a reunião, pedi para usar meu smartphone e tuitar. Obtive permissão da presidência para isso e fiz algo inovador, a primeira cobertura em tempo real pelo Twitter de uma reunião da Presidência.

Mas não era uma reunião privada?

Essa história de reunião privada é uma ficção que inventaram. O encontro sempre foi público. Na Campus Party, semanas antes desse encontro, a ministra Dilma Roussef (Casa Civil) comentou sobre o encontro, disse que o governo ouviria todas as partes envolvidas, etc.

Há meses que se fala que a Telebrás receberá investimentos, isso não fui eu quem disse. Ao participar do encontro, o que eu fiz foi divulgar informações sobre banda larga pelo Twitter, algo muito pertinente, aliás. Quer melhor plataforma para discutir banda larga que o Twitter?

O senhor foi acusado de vazar informações?

Isso é invenção de alguns péssimos jornalistas. O que eu tuitei foi mais ou menos o que outras pessoas disseram, em entrevistas, ao sair da reunião. A diferença é que eu escrevi sobre isso um pouco antes, cobrindo o encontro via Twitter. Como não sou jornalista nem tenho diploma de jornalista, isto pode ter irritado algumas pessoas.

O senhor saiu otimista do encontro?

Eu acho positivo que o Governo Federal se preocupe em levar internet a lugares onde ela não chega hoje. Acho muito positivo também a ideia de baratear os custos da banda larga nas localidades onde ela já chega, aumentar a competição entre as teles. Nesse sentido, como um militante da inclusão digital, não há como ser contra a ideia.

Há críticas de que o governo só pensou na banda larga porque 2010 é ano eleitoral...

Bom isso é da dinâmica da política. Se você fosse candidato, talvez também agisse assim. Eu acho que a sociedade deve aproveitar esses momentos para pressionar os políticos por respostas. Eu quero saber o que os políticos vão fazer para melhorar nossa banda larga, que opiniões eles tem sobre direitos autorais, o que eles pensam sobre um novo marco civil para internet no Brasil.

Eu quero saber tudo isso antes de decidir que posição política eu terei nas eleições. Acho que a sociedade deve aproveitar esses momentos para discutir os temas que lhes importa. Não falo só do Governo Federal.

Em São Paulo, por exemplo, o governador Serra apresentou um plano de banda larga – que eu chamo de banda média, pois a velocidade dos pacotes é de 256 Kbps – em que há isenção de ICMS. Acho todas as medidas que ajudam a baratear o custo da internet no Brasil algo positivo.

A definição de preços e cobertura de banda larga não ficaria melhor sob controle do livre mercado e da livre concorrência?

Veja, até os Estados Unidos, que são o país mais liberal do mundo, possuem um Plano Nacional de Banda Larga. E lá, o plano do Obama é bem mais agressivo que o brasileiro. Há fortes investimentos do Estado para levar a internet a pontos em que a iniciativa privada não pode ou não teve interesse em levar o acesso.

Então o senhor é a favor então da atuação de uma Telebrás estatal no mercado de banda larga?

Pelo o que eu pude perceber no encontro com Lula, a ideia não tem nada a ver com reestatização de serviços. O fato é que a Telebrás possui uma rede com milhares de quilômetros de fibra óptica que estão ociosos. Isto é um desperdício em um país que precisa tanto de infraestrutura.Dizem que o Brasil é a bola da vez na economia global. Mas como ser uma potência se a população não tem acesso à web?

Seja como gestora de uma nova rede, seja em parceria com empresas privadas, a Telebrás deve dar sua contribuição para a inclusão digital. Acredito, aliás, que é um dever do Estado garantir banda larga a seus cidadãos. Se a iniciativa privada levasse, por conta própria, o acesso à web até os pontos remotos do Brasil, não precisaríamos discutir isso agora, né?

Não seria melhor fomentar a competição entre as teles a recriar uma estatal?

O que o Lula afirmou na reunião é que vai sempre avaliar o que for melhor para o Brasil em cada situação pontual. Se a iniciativa privada for eficaz em determinadas regiões, então o Estado não precisa investir lá. Mas o fato é que as teles não fizeram esse trabalho.

Banda larga é um produto muito caro no Brasil, há pouca concorrência e em pequenas cidades do Brasil os consumidores simplesmente não tem opção nenhuma. Afinal, onde há poucos consumidores não há interesse econômico em montar uma rede. Nesse cenário, acho positivo a atuação do governo.

O governo tem recursos para cumprir as metas que propõe de inclusão? (O plano prevê levar banda larga até 68% dos domicílios brasileiros até 2014 e levar conexões a mais de 4100 municípios)

Bem, após seis ou sete anos de brigas judiciais, o governo conseguiu tomar posse de milhares de quilômetros de fibra óptica. Este é um ativo que já existe. Além disso, há os recursos do Fust (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações).

O Fust tem R$ 10 bilhões em caixa e arrecada R$ 1 bilhão ao ano. Há dúvidas jurídicas sobre se estes recursos podem ou não ser usados para fins de ampliar o acesso à web no Brasil. Eu torço para que esses recursos sejam liberados. Acho um desperdício todo esse dinheiro parado e a Telebrás com fibras ópticas ociosas ao mesmo tempo em que a banda larga custa tão caro e não chega em tantas localidades.

Felipe Zmoginski, de INFO Online