Iniciamos esse documento destacando a iniciativa do Ministério da Cultura de submeter a toda a sociedade brasileira, a proposta de reforma da legislação autoral. O debate deve ser pressuposto para qualquer sociedade democrática. Ser contra o debate público é característica de quem não quer a transparência. Acesse e participe (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/consulta_publica/DireitosAutorais.htm)

A lógica da indústria cultural naturalizou a idéia de que o acesso a bens culturais está ligado diretamente ao pagamento. Assim, quem pode pagar tem acesso, condições de divulgar, criar, produzir e quem não pode pagar está excluído. E é dentro dessa lógica que a prática do jabá é comum.

Não defendemos que tudo tem que ser gratuito, muito menos concordamos com a idéia de que quem baixa conteúdos culturais na rede é criminoso. A cultura livre, nos coloca um grande desafio nesse debate, que é equilibrar o acesso público à música/cultura e à remuneração justa do criador(a).

Ou seja, não se trata de dizer que o criador não tem que receber nada e que tudo tem que ser de graça, mas de perceber que o mundo mudou radicalmente e que a atual legislação que se aplica ao mundo físico das cópias escassas faz pouco sentido sentido no novo universo digital.

Por exemplo: hoje somos multidões de criminosos quando disponibilizamos ou baixamos músicas para uso privado e sem fim de lucro, somos criminosos quando copiamos mesmo aqueles livros em processo de destruição pelo tempo e manuseios. Vale perder o livro, mas jamais copiar. Somos também criminosos quando copiamos livros esgotados.

Esse sistema de acesso e produção cultural hegemônica é agora fortemente impactado pela chamada “sociedade da informação e do conhecimento”, pela “revolução da informação, da comunicação” e das “redes sociais”.

A lei tal como está hoje é péssima para a cultura e para a música, não permite a ampla divulgação de bens culturais na rede, nem muito menos a transparência no processo de arrecadação e repasse dos valores de direitos autorais.

As entidades representativas de autores tem manifestado-se contra, mas a reforma da legislação autoral é também sugerida pela CPI do Ecad em SP, de onde destacamos o trecho do relatório final: “O que é preciso lembrar é que nenhum Estado moderno concede monopólios sem prever instâncias administrativas de supervisão e regulação. É uma prevenção contra possíveis abusos no exercício do direito. Por isso a exigência mínima que encontramos na maioria dos países é que os regulamentos de cobrança e tabelas de preços devam ser submetidas a uma instância pública, que muitas vezes é o órgão responsável pela regulação da concorrência.” http://www.al.sp.gov.br/StaticFile/documentacao/cpi_ecad_relatorio_final.htm

Por isso tudo, entendemos que quem baixa música sem fins lucrativos não é criminoso nem pirata, é divulgador! Semeia gratuitamente a cultura à medida que partilha conteúdos culturais.

E assim nos manifestamos a favor da revisão da legislação autoral destacando os seguintes pontos necessários ao avanço:

1 – Permitir na internet cópia de obra integral para uso privado sem fins de lucro;

Artigo 46, aborda a possibilidade de cópia privada, mas não trata de troca de arquivos pela internet, ou seja as redes p2p continuarão ilegais no Brasil. Sabemos que o Brasil é signatário de diversos acordos internacionais que dificultam legalizar o p2p, mas com esse processo de consulta, cabe ao Brasil levar esse debate aos organismos internacionais.

Por isso defendemos que a reforma da Lei de Direitos Autorais leve em conta o processo de trocas na rede. Tanto a atual lei autoral quanto a proposta de reforma não levam em conta que os conteúdos culturais não são competitivos entre si, podem ser compartilhados amplamente, sem que haja a escassez. Legalizar a disponibilização dos materiais e cópias digitais integrais irá superar a concentração da produção cultural, desde que esteja evidenciado o uso privado sem fins de lucro. Dessa maneira o Brasil irá ampliar a disseminação cultural, promover artistas e autores e diversificar o acesso dos usuários. Ao contrário do que prega a indústria cultural, que irá diminuir suas margens de lucros com a nova realidade, a livre circulação de conteúdo cultural na internet é um ponto fundamental para a produção de conhecimento. A sociedade ganha como um todo.

Artistas, autores, produtores, intérpretes, investidores e o público. É isso que queremos: uma maior distribuição de recursos, incluindo também criadores iniciantes e independentes, na economia da cultura.

Ainda, nesse tema no artigo 46 – Inciso I e II, concordamos quando a proposta menciona que está autorizada a reprodução e a conversão de formatos para seu uso privado e não comercial, e notamos complexidade para regulamentar a parte: desde que “… obra legitimamente adquirida, desde que feita em um só exemplar e pelo próprio copista… “.

Como podemos saber se a obra foi ou não adquirida legitimante e se foi feita apenas 1 cópia e quem adquiriu? Propomos retirar desses dois artigos a parte: “legitimamente adquirida, desde que feita em um só exemplar e pelo próprio copista”

2 – Na I Conferência Nacional Comunicação, propomos e foi aprovada a seguinte proposta: “PL 401: Toda a produção de bens culturais financiados integralmente com recursos públicos deve ser distribuída utilizando licenças e formatos livres…” (Consulte aqui: http://www.secom.gov.br/sobre-a-secom/publicacoes/confecom/confecom-pdf). Na II Conferência Nacional de Cultura no SUB–EIXO: 2.3 – Acesso, Acessibilidade e Direitos Culturais, aprovou-se entre as 32 propostas prioritárias, a proposta (http://blogs.cultura.gov.br/cnc/files/2010/03/Propostas-32-finais.pdf): “124 – Criar dispositivos de atualização da lei de direitos autorais em consonância com os novos modos de fruição e produção cultural que surgiram a partir das novas tecnologias garantindo o livre acesso a bens culturais compartilhados sem fins econômicos desde que não cause prejuízos ao(s) titular(es) da obra, facilitando o uso de licenças livres e a produção colaborativa, considerando a transnacionalidade de produtos e processos de forma que se atinja o equilíbrio entre o direito da sociedade de acesso à informação e à cultura e o direito do criador de ter sua obra protegida, assim como o equilíbrio entre os interesses do autor e do investidor.”

Nenhum autor ou investidor será prejudicado se suas obras estiverem disponíveis digitalmente em formatos livres. Defendemos inserir adequadamente a proposta como um novo artigo na nova lei de direitos autorais. Entendemos que não é justo que conteúdos culturais/artísticos financiados com dinheiro público sejam comercializados a preços de mercado, disponibilizados em formatos fechados e sob os interesses do copyright. Todo o conteúdo produzido com financiamento público deve ser disponibilizado em formatos abertos para garantir a interoperabilidade, ou seja, utilizar por exemplo os padrões: SVG (Scalable Vectorial Graphics), PNG (Portable Network Graphics), Ogg, etc.

3 – Conversão de formatos: Concordamos parcialmente com o artigo 46 – II, propomos a retirada da seguinte parte: “legitimamente adquirida”. Fora essa questão a proposta possibilitará converter os formatos de arquivos e copiar para os diferentes dispositivos eletrônicos, como players musica digital, celulares e computadores.

4- Concordamos integralmente com o artigo 46 inciso XIII.

5- Fiscalização do ECAD – Artigos 98, 98A e 98B – Concordamos com o acréscimo. Concordamos plenamente com a proposta de tornar transparente todo o processo de arrecadação e repasse do direito autoral. Defendemos que todos os valores arrecadados e repassados sejam publicados em página eletrônica na internet em formatos abertos de banco de dados ou planilhas eletrônicas para facilitar a efetivação de cálculos e fácil fiscalização pela sociedade. Defendemos também a criação do Instituto Brasileiro de Direito Autoral, que terá a finalidade de regular e supervisionar as entidades de arrecadação de direitos, e inclusive, que o IBDA seja acompanhado por um conselho gestor eleito pela sociedade, de acordo com a experiência do Comitê Gestor da Internet no Brasil (Cgibr). A partir da experiência do CGIBR, pessoas de cada área da cultura solicitam cadastro para o colégio eleitoral, e após aceito o pedido, qualquer pessoa pode candidatar-se dentro de uma determinada área. Após os candidatos enviam os documentos para a comissão eleitoral e são homologados. Com um período para os candidatos apresentarem suas propostas. Depois a votação é feita pela internet. O processo eleitoral deve fornecer para cada candidato ou votante certificação digital, para dessa maneira a votação ser segura. E é claro, a sociedade civil deve na composição ser maioria que o governo. Dessa maneira o processo será público e com controle social e não apenas estatal ou privado, como se observa hoje no modelo praticado pelo ECAD.

6 – Combate ao Jabá – Artigo 110B – Concordamos com o acréscimo. A proposta torna a prática do jabá algo ilícito. O jabá é um dos principais crimes contra a diversidade musical e cultural brasileira. Devemos acrescentar a esse dipositivo, quais os possíveis praticantes do crime (artistas, produtores, gravadoras, rádios e tvs, etc) e prever punições para cada tipo de agente. O atual mercado da música funciona com sistema de monopólios sem qualquer transparência: o estado garante monopólio ao ECAD. Além disso, há o monopólio da comunicação (concessão pública), que determina quais e em que condições os conteúdos culturais serão executados. Mesmo em decadência as gravadoras ainda apropriam-se dos direitos patrimoniais dos fonogramas de artistas que assinam contratos obedecendo à lógica imposta pelo velho modelo. A saber, modelo arcaico que inclui o sistema de amostragem no tocante ao repasse de direito autoral, onde se apresenta ainda a amplamente executada e sobretudo nefasta prática do jabá que privilegia os grandes conglomerados também denominados “majors”.

Neste ponto, defendemos então:

a – O fim da amostragem para pagamento de direito autoral (já existe tecnologia permitindo aferição online de execução em rádio e televisão, por exemplo);

b – As emissoras de radiodifusão que praticarem o Jabá devem ter suas concessões públicas revogadas;

c – A criminalização de toda prática que, dentro da nova legislação, possa ser definida como jabá.

Também, por tudo isso, debater e propor a reforma do direito autoral é central para a diversidade musical e cultural em nosso país e sobretudo para que haja uma maior distribuição de recursos a um número maior de criadores, autores, músicos, intérpretes, produtores culturais, etc. Sejamos conscientes e participativos nesse processo pois a cadeia produtiva da cultura se beneficiará disso, dos avanços que estão em jogo nesse momento histórico. Por isso, manifeste-se, cobre, argumente e assine esse documento!

Assinam:

- Movimento Música para Baixar – MPB
- A Trupe d’o Teatro Mágico – MPB/SP
- Banda Bataclã FC – MPB/RS
- Banda infantil Zuando Som – MPB/RS
- Banda Mandala Soul – MT
- Banda Nuvens – MPB/PR
- Banda Sol na Garganta do Futuro – MPB/ES
- Banda Top Surprise – Juiz de Fora/MG
- Carlos Aquino dos Santos – Músico e Produtor cultural – coletivo lets rock (rio do sul – sc)
- Christian Garcia – Banda Bleffe MPB/RJ
- Cineclube Cinemando de Sola – Franca/SP
- Diego Lotin – Músico e Produtor cultural – coletivo lets rock (rio do sul – sc)
- Eme Calabar – Selo e portal micróbio grava sons (musinvest música independente)
- Everton Rodrigues – MPB/RS – Integrante do Colegiado de Música do Conselho Nacional de Políticas Culturais
- Fernando Anitelli – MPB/SP – Trupe o Teatro Mágico
- Gustavo Anitelli – MPB/SP – Trupe o Teatro Mágico – Integrante Rede Música Brasil
- Instituto Mandala – MT
- Israel do vVle – Jornalista e Produtor Cultural
- Izabela Freitas – MPB/SP e Jornalista
- Jaqueline Fernandes – MPB/DF – Grio Produções
- Jean Mafra – MPB/SC – Integrante do Colegiado de Música do Conselho Nacional de Políticas Culturais – músico e produtor cultural – coletivo de coletivos de música de santa catarina, scconectada (que representa aproximadamente 200 músicos em todo o estado).
- Jomar Silva – Músico e especialista em padrões abertos.
- Leoni – MPB/RJ – Músico e Compositor
- Lis Rodrigues – Clube Caiubi
- Osmar Ricardo Lazarinni (Sonekka) – Clube Caiubi
- Pedro Jatobá – Coordenador da Rede Colaborativa ITEIA / Diretor de Ações Culturais do Instituto Intercidadania
- Rapper Poeta GOG – MPB/DF – Conselho Nacional Políticas Culturais
- Thiago Pondé - Cantor e Produtor Cultural – CUCA DA UNE - Coordenador Artístico Nacional – Movimento Fanfarra das Artes.
- Ulysses Dutra – Músico e Jornalista
- Vinícius Neves Zimmerman – Músico e Produtor cultural – coletivo lets rock (rio do sul – sc) e presidente da Associação da cadeia produtiva de música de Santa Catarina – MUSICATARINA